Sete anos depois, como está o polo automotivo da Stellantis em Pernambuco

Complexo em Goiana já produziu mais de um milhão de veículos e impulsionou desenvolvimento econômico e social do interior do estado

Natália Scarabotto

Natália Scarabotto

Complexo em Goiana já produziu mais de um milhão de veículos e impulsionou desenvolvimento econômico e social do interior do estado

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Entre astrólogos, os ciclos de sete anos marcam as evoluções e diferentes fases da vida. Independentemente da teoria, uma coisa é certa: a Stellantis está perto de completar o primeiro septênio do seu polo automotivo em Pernambuco com grandes resultados e novas ambições.

Quando a fábrica da Jeep foi instalada em Goiana, cidade a 65 km de Recife, em 2015, a líder da produção Elizabeth Henrique de Melo, 40, não imaginava como a chegada do complexo automotivo da Stellantis transformaria a realidade de sua família – e de toda a região.


RELEMBRE:

– Jeep faz futuro chegar rápido a Goiana


“Eu trabalhava em uma padaria em outra cidade, pegava seis conduções para ir e voltar, não tinha nenhuma perspectiva lá”, contou Elizabeth. “Meu sonho era estudar administração, porque só tinha o ensino médio. Hoje sou a única entre meus pais e oito irmãos a conseguir cursar uma faculdade e trabalhar em uma grande empresa. Isso dá muito orgulho.”

Nos últimos anos, Pernambuco se consolidou como grande polo automotivo e de autopeças, desconcentrando parte da indústria do eixo Sul-Sudeste. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), dos 14,3 milhões de veículos produzidos no Brasil entre 2015 e 2021, 7,3% vieram instalações de Goiana, cuja participação aumentou de 2,4% para 13,2% no período.

Stellantis em Pernambuco perto da capacidade plena

Com investimento de R$ 13,9 bilhões até agora, a unidade pernambucana se destaca pela sustentabilidade, otimização de processos e, principalmente, tecnologia. São mais de 600 robôs para fabricar os Jeep Commander, Compass e Renegade – além da Fiat Toro para os mercados brasileiro e latino-americano

“A planta de Goiana foi instalada como a mais moderna do grupo Stellantis. Ainda é uma das mais modernas, mas também é de alta performance. A gente tem o segundo melhor custo de transformação entre as mais de 50 plantas da Stellantis no mundo. Conseguimos ser bem competitivos”, disse o gerente de fábrica da Jeep, Mateus Marchioro.

Com capacidade para fazer 280 mil carros por ano, a unidade nordestina já fabricou mais de um milhão de veículos. Em 2021, mesmo com a crise de semicondutores, a produção bateu recorde, com mais de 253 mil unidades. Neste ano, serão 221.912 carros produzidos nas linhas da Stellantis em Pernambuco.

“Com os vários impactos das questões de semicondutores, [fechamos o ano com] produção um pouco menor que o ano passado, mas tivemos em 2022 um grande crescimento para exportação, com 28 mil unidades”, afirmou Marchioro.

Em momento desafiador para o setor automotivo, seja pela escassez de componentes ou de demanda, o polo da Stellantis em Pernambuco vai bem, obrigado. São três turnos de produção, 48 carros fabricados por hora, 5 mil funcionários e 16 fornecedores instalados dentro do complexo industrial. Além disso, mais 34 fornecedores em diversas cidades adjacentes abastecem a unidade. 

Produção e estímulo ao desenvolvimento social

O polo automotivo coloca em prática o que se propôs desde o começo: impulsionar o desenvolvimento social e a economia pernambucana – principalmente na área de influência da Stellantis, a Zona da Mata, e em parte do Agreste, onde está a fabricante de baterias Moura. Essas duas regiões, junto ao litoral, concentram 80% da riqueza do estado.

Segundo estudo recente da Ceplan (Consultoria Econômica e Planejamento), encomendado pela Stellantis, desde a instalação da montadora, o município de Goiana ganhou mais peso no PIB pernambucano. De 2010 a 2019, Goiana saltou da 13ª posição no ranking estadual para a 4ª posição, sendo responsável por 5,17% da economia do estado, com R$ 10,2 bilhões.

Entre 2015 e 2019, enquanto o PIB pernambucano crescia, em média, 0,5% anualmente, a área de influência da Stellantis cresceu 6,3% ao ano. Já Goiana teve expansão bem mais acelerada, de 20,5% ao ano na produção de bens e serviços.

Com o complexo automotivo, o emprego teve crescimento médio de 5,6% ao ano, puxado pela expansão da cadeia de fornecimento. Em Goiana, só o parque de fornecedores da Jeep representa 1/4 do trabalho formal do município.

“O Nordeste não tinha vocação para a indústria automotiva, mas criamos as condições para desenvolver o setor”, disse o diretor-presidente da Agência de Desenvolvimento de Pernambuco (Adepe), Roberto de Abreu e Lima Almeida. “O nosso papel hoje como agência é atuar com a Stellantis para incentivar que os fornecedores venham para cá, com o objetivo de interiorizar o desenvolvimento”, afirmou o diretor da Adepe.

Stellantis busca fornecedores em Pernambuco

No total, a Stellantis tem uma cadeia de 16 fornecedores no supplier park de Goiana, 34 instalados por Pernambuco e mais dois que “estão praticamente fechados para o ano que vem”, garante o diretor da Adepe, que atua nas negociações, sem dar detalhes.

Em outubro, a Yazaki, fabricante de chicotes automotivos e dispositivos eletrônicos inaugurou a sua primeira fábrica em Bonito, na região do Agreste. O projeto teve investimento de R$ 60 milhões e gerou 1.600 empregos diretos.

Também ali perto, no município de Belo Jardim, está a fábrica de baterias da Moura, desde 1957. Como pioneira do setor automotivo na região, foi uma base importante para a chegada da Stellantis.

Nos últimos 12 anos, a Moura investiu R$ 1,6 bilhão em seu complexo no aumento da capacidade produtiva, expansão das unidades fabris e avanços tecnológicos, que contribuíram para fazer do município um hub de empregos e formação de mão de obra qualificada para pequenas cidades vizinhas.

Renúncia fiscal, mas com aumento da arrecadação

Para atrair a indústria automotiva, em 2008 a lei nº 13.484 criou o Programa de Desenvolvimento do Setor Automotivo de Pernambuco (Prodeauto), que concede incentivos fiscais na área do ICMS.

Segundo o diretor da Adepe, o desconto do ICMS para o setor automotivo é um deferimento parcial, com carga tributária de 4% para os fornecedores da Stellantis. A montadora, no entanto, tem um regime diferente, no qual a empresa tem 95% de desconto sobre o saldo devedor, explicou Almeida. Ainda assim, a Stellantis está entre os cinco maiores arrecadadores de ICMS do estado.

Segundo dados da Secretaria da Fazenda de Pernambuco, a arrecadação do ICMS do segmento automotivo entre 2015 e 2021 cresceu de R$ 204 milhões para R$ 917 milhões, aumento de 28,4% ao ano. Enquanto isso, no mesmo período, o estado de Pernambuco teve retração de 1,2% ao ano.

Stellantis Pernambuco tem foco em exportações

O polo automotivo também reconfigurou o comércio exterior de Pernambuco. No ano passado, Goiana respondeu por 10% das exportações de carros do Brasil, segundo o estudo da Ceplan. 

Entre 2015 e 2021, a Stellantis exportou 15% de sua produção para a América Latina e parte da América Central, com mais de 150 mil unidades que saíram pelo Porto de Suape. Nada mal para o primeiro septênio, diriam os adeptos da astrologia e até mesmo os céticos.