Com uma longa cadeia de produção, segmento alavanca a economia e cria milhares de empregos. Mas, como os demais segmentos da indústria, tem sofrido com a redução da participação no PIB
A indústria de autopeças é pilar essencial para a evolução do setor automotivo no Brasil. “Basta lembrar que 70% do custo de um veículo corresponde a insumos e, especialmente, a autopeças”, afirma George Rugitsky, diretor de economia e mercado do Sindipeças, a entidade dos fabricantes de autopeças. Ele admite, no entanto, que o setor já teve participação maior no passado e hoje espera uma ação do governo tendo em vista a reindustrialização do país.
Em 2022 o faturamento dos associados do Sindipeças somou US$ 45,2 bilhões, com crescimento de 13,3% sobre o ano anterior. Desse total 64,2% vieram de vendas a montadoras, 19% do mercado de reposição, 11,9% de exportações e 4,9% de negócios intrassetoriais.
No ano passado os investimentos das empresas somaram US$ 1,29 milhão, dos quais 64% em máquinas e equipamentos, 19% em outros tipos de ativos fixos, 4,2% em pesquisa, desenvolvimento e inovação e 12,8% em outros itens.
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De acordo com Rugitsky, o que mais prejudica o desempenho dos mais de quinhentos associados da entidade é a instabilidade macroeconômica e o custo Brasil. Levantamento recente do governo anterior indicou que as ineficienciais estruturais do pais somam R$ 1,7 trilhão por ano, exigindo em contrapartida uma ampla reforma tributária e administrativa.
Para o diretor do Sindipeças, diversos itens foram atacados no governo anterior, tais como o marco do saneamento básico e da navegação de cabotagem. Já a reforma tributária, principal item do custo Brasil, está em pauta no momento na atual gestão – que tem a reindustrialização dos país entre suas principais agendas.
Ineficiência afeta em cheio o setor de autopeças
No caso de autopeças, é difícil quantificar o custo Brasil, mas há certeza de que o montante prejudica de modo significativo a contribuição para a formação do PIB nacional. Na opinião do Sindipeças, os principais itens do custo brasil a serem trabalhados, além da reforma tributária, são a reforma administrativa, os acordos de livre comércio, a bitributação e os preços de transferência nas importações e exportações, para não prejudicar as transações com o exterior.
Para o Sindipeças, os acordos devem ser horizontais, graduais e transparentes para permitir que a economia se adeque às mudanças. “Medidas pontuais não vão ajudar o país”, alerta Rugitsky.
O executivo alerta que, se não corrigirmos as condições macroeconômicas, o país e a indústria não crescerão e tampouco a contribuição de autopeças para o desenvolvimento nacional. “O pensamento para o crescimento deve ser holístico. Senão teremos pela frente novos voos de galinha”, diz.
Vale lembrar que milhares de componentes geram o atendimento feito pelo mercado de reposição, que responde por um quinto do faturamento da indústria de autopeças. Muitas das associadas do Sindipeças atendem exclusivamente a reposição independente, complementando a atuação das concessionárias de veículos.
Indústria de autopeças de olho na eletrificação
No que se refere à eletrificação, Rugitsky garante que muitas empresas associadas ao Sindipeças já estão tratando de acompanhar as mudanças, de maneira a criar uma indústria local de suprimentos para acompanhar a evolução das exigências setoriais.
“Muitos subsistemas de um veículo, como itens de segurança, suspensão e conforto, serão comuns a veículos eletrificados e com powertrain a combustão. A revolução virá na área de motores, transmissão e eixos”.
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Em função da data do fim o motor de combustão estar definido em alguns países, as empresas de autopeças multinacionais já estão avançadas na adequação das suas linhas de produto para esta transição tecnologia e trarão estas tecnologias para o Brasil, quando houver demanda, aponta Rugitsky.
Como no Brasil não prazo para o fim o motor a combustão, a incerteza é maior para as empresas locais. E é preciso considerar que, ao contrário do que ocorre em nações ricas, não devem ocorrer subsídios na aquisição dos veículos elétricos.
“O objetivo final é a descarbonização e existem diversas rotas tecnológicas para chegar lá, as empresas de autopeças devem se adequar ao ritmo da transição tecnológica do conjunto das montadoras localizadas no país”, afirma o diretor de economia do Sindipeças, esclarecendo que todos os negócios dependem de previsibilidade e não há definição ainda no Brasil. Assim, a demanda é que irá definir a velocidade para os veículos a bateria.
Desequilíbrio no comercial internacional
No comércio internacional, a contribuição do setor de autopeças é negativa, apresentando déficits seguidos. O débito tem, inclusive, aumentado, já que a gama e a sofisticação dos veículos avança, com mais itens importados. Em 2022 o balanço do segmento acusou um déficit de US$ 11,3 bilhões, com exportações de US$ 8,3 bilhões e importações de US$ 19,6 bilhões.
Uma parcela do déficit vem da área de transmissões, com a escolha crescente de componentes automáticos e eletrônicos não produzidos localmente. Mas uma parcela significativa vem de um menor rigor na definição de itens sem produção local.
Enquanto as alíquotas normais para importação são de 14% a 18%, nos casos especiais cai para 2%, privilegiando as importações. “O efeito é a desindustrialização, com a queda do rigor”, afirma Rugitsky.
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Ele comenta que o setor de autopeças puxa para cima o desenvolvimento da economia, apesar de todas as dificuldades. “Não há carro sem autopeças e temos uma indústria automotiva bastante completa, ao contrário do que ocorre em outros países, que têm apenas maquiladoras, empresas que se valem da importação de componentes para fazer a montagem dos veículos, contabilizando para o país uma pequena agregação de valor”.
E completa: “ao longo dos 70 anos que o Sindipeças está completando agora, a indústria de autopeças local contribuiu de forma significativa para o crescimento do país”.
Indústria de autopeças pronta para veículos híbridos flex
A indústria de autopeças vai investir quando houver demanda, explica o diretor, admitindo que já existem iniciativas locais visando a eletrificação, como a Toyota faz ao anunciar investimento de R$ 1,7 bilhão para desenvolver e produzir um novo veículo híbrido flex.
Há também notícias de iniciativas para a produção local de baterias, motores e outros componentes para veículos elétricos. A Randon desenvolveu carretas eletrificadas em que, à exceção das células de baterias, todo o restante foi desenvolvido no Brasil.
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Rugitsky avalia que, em momentos de estabilidade tecnológica, as empresas fazem melhoria contínua em seus produtos. Ele aponta que as organizações procuram nichos em que poderão se diferenciar no futuro. “Vivemos esse momento. Há uma infinidade de ideias sendo desenvolvidas – algumas se provaram vencedoras e outras não”.
Ele pondera que o Rota 2030, política industrial em vigor para o setor automotivo, se baseia em pesquisa e desenvolvimento, com o objetivo de diminuir o gap entre os veículos produzidos no mundo e no Brasil. Segundo ele, o programa tem gerado resultados, como a adoção de novos itens de segurança importantes e o controle ambiental.
Outra vantagem da legislação é a gradualidade, indicado o executivo. Foram definidos objetivos para os primeiros cinco anos e agora virão as metas para os próximos cinco anos a partir de 2024. “Trata-se de um programa moderno que a indústria de autopeças propõe que seja adotado horizontalmente na indústria brasileira”, comenta o diretor do Sindipeças.
Finalizando, Rugitsky argumenta que quando falamos em descarbonização, meio ambiente e segurança viária, não podemos esquecer de acompanhar a correta manutenção da frota circulante. Na visão dele, já passou da hora do Brasil adotar a inspeção técnica veicular (ITV), existentes em todos os países com frotas relevantes.
A ITV, garantindo a correta manutenção dos veículos, reduz a poluição que afeta a saúde da população, reduz o número de acidentes, que além de causar ferimentos e mortes, acarretam o aumento do trânsito e, consequentemente, elevação do consumo de combustíveis.
Um passo na direção correta são os programas pilotos para a renovação de frotas de caminhões. Para efeito de comparação, um veículo com as tecnologias Euro 5 emite 80% menos gases nocivos do que os veículos Euro 0.