Desde janeiro à frente da BMW no Brasil, mexicana conversou com exclusividade com a reportagem de Automotive Business
Como repórter, costumo evitar a aplicação de quaisquer adjetivos aos entrevistados. Todavia, sempre temos exceções. Maru Escobedo é uma delas. À frente da BMW no Brasil desde janeiro, a executiva tem sorriso que exala entusiasmo, além de magnetismo e pujança típicos de uma liderança que entende do riscado. Não à toa, em seu país de origem, o México, foi uma das responsáveis por consolidar a marca como a número 1 em vendas de veículos de luxo e eletrificados.
Agora, Maru tem de guiar a BMW no Brasil em seu processo de modernização, que passa pela digitalização e pela transição energética. Ela também será responsável por dar mais força à unidade que a companhia tem em Araquari (SC), assegurando a montagem de novos produtos da marca na fábrica e a subsequente exportação de modelos feitos por lá.
Por conseguinte, terá de manter a empresa na liderança do segmento premium. A executiva, aliás, garantiu que a fabricante de origem alemã pretende crescer, no mínimo, 5% no país em 2023.
Tudo isso e, evidentemente, muito mais, foi dito pela presidente da BMW no Brasil em entrevista exclusiva à Automotive Business. Nossa reportagem esteve na Cidade do México, em evento focado em diversidade organizado pelo grupo, e conversou com a executiva.
Além dos tópicos supracitados, falamos acerca de seus primeiros meses à frente da companhia em nosso país, as nuances entre os mercados brasileiro e mexicano e sobre possíveis novos investimentos da empresa por aqui. Confira abaixo a entrevista com Maru Escobedo.
Quais foram os desafios que você, como uma liderança feminina, teve de enfrentar para chegar aonde chegou?
Acho que sequer cheguei a pensar nos desafios. Na realidade, eles, claro, aparecem e você trata de enfrentá-los e solucioná-los. Sou muito otimista e, por isso, gosto de qualquer tipo de desafio.
Tive oportunidade de exercer diversas funções de gestão na área de vendas da BMW e, em vendas, você tem de ter essa paixão, essa vontade de enfrentar os percalços. Penso que temos de trabalhar a fim de encarar os obstáculos que nos são impostos. É muito difícil, claro, mas sempre gostei disso – e gosto.
Quais são suas principais expectativas ao assumir como a primeira presidente mulher da BMW no Brasil?
Esta é uma grande oportunidade. Não por ser, especificamente, a primeira mulher, mas pelas perspectivas da BMW, de crescer, de ampliar os negócios no Brasil e de poder estreitar relações com os concessionários.
Mesmo assim, vejo que a questão de ser a primeira mulher é um tema. Estou muito orgulhosa por isso. O Brasil é um país maravilhoso, as pessoas são maravilhosas. Existem inúmeras oportunidades e temos que trabalhar essas oportunidades. Este é o desafio, não o fato de eu ser mulher.
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Contudo, gosto quando as pessoas me dizem: “Maru, que legal que você é uma liderança feminina”. Isso é positivo para mim. Quero ser um exemplo, mas não me vejo como um exemplo. Eu só trabalho, trabalho e fiquei muito feliz com o reconhecimento que me foi dado pela BMW, com esta oportunidade de estar num mercado tão importante para a empresa.
Como tem sido os primeiros meses à frente da BMW Brasil?
Desafios todos os dias [risos]. Primeiro porque você pode notar que ainda não falo um bom português e esse foi o primeiro desafio. No entanto, como já disse, as pessoas são incríveis e me sinto em casa.
Em termos de negócios, enfrentamos problemas e temos oportunidades. Mas os brasileiros são ótimos. As pessoas são cooperativas e são muito cordiais – o que me ajuda bastante na hora de trabalhar com a equipe, como um time, para obter os melhores resultados.
No México, você já tinha a facilidade de conhecer o mercado. Chegou a notar diferenças entre os mercados mexicano e brasileiro e também vê similaridades entre ambos?
As similaridades são claras. Somos uma companhia de vendas e temos que oferecer serviço de alta qualidade aos nossos clientes. O Brasil, porém, tem uma particularidade. Toda essa estrutura impositiva de taxação que difere bastante do México.
Temos em Araquari (SC) uma planta muito importante para o mercado brasileiro, mas estratégica para o BMW Group a nível mundial. Produzimos atualmente lá o Série 3 e, agora, o X1. Isso, para mim, também é novidade. No México era responsável apenas por vendas e pós-vendas e, no Brasil, sou responsável pelo todo. Obviamente que se trata de algo que traz muito mais responsabilidades.
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Vejo ainda que os clientes brasileiros são um pouco diferentes dos mexicanos. Enquanto no México há uma influência muito grande dos Estados Unidos, assim como no Brasil. No entanto, lá há também certa influência europeia e, ultimamente, da China [na compra e no pós-venda].
Para o cliente brasileiro, os processos de digitalização são muito importantes. Além disso, a sustentabilidade também é um tópico caro. Notamos também que o Brasil passa por um período de desenvolvimento importante da tecnologia 5G, que nos oferece muitas possibilidades.
A BMW liderou novamente, pelo quinto ano consecutivo, acho, o segmento premium na América Latina. No Brasil fechou em primeiro, com quase 13,8 mil unidades vendidas. Quais são as perspectivas para 2023?
Nós queremos crescer, mas dependemos fortemente da produção, tanto local, em Araquari, quanto do que podemos importar da Alemanha e da China – embora sejam poucas unidades da China. Pretendemos crescer, no mínimo, 5%.
E, justamente por isso, vocês seguem com calendário agitado em 2023. Lançaram o novo X1, por exemplo, com produção nacional, e ainda lançarão ix1, i7, X7 e o M2, que é feito aqui no México. Há algum outro produto previsto para este ano? E como você já analisa 2024 em termos de lançamentos da BMW no Brasil?
Já temos estes lançamentos que você já mencionou e temos também outras novidades como X5 e X6. Naturalmente temos lançamentos programados para o próximo ano, mas ainda não posso revelar. Temos, vale frisar, um calendário diferente do que em outros países.
É muito importante destacar que vamos continuar com nossa estratégia de eletrificação. Para nós, são fundamentais no momento tanto os híbridos quanto os puramente elétricos. Vamos aliar isso ao que já estamos aplicando em digitalização.
E por isso a BMW optou por só vender o i7 no mercado brasileiro?
Sim. Até porque o i7 destaca todas as nossas tecnologias e propósitos. É um produto que traz eletrificação, digitalização, sustentabilidade. Para o Brasil, é perfeito.
A BMW acredita que, além dessas tecnologias já citadas, há espaço para outros tipos de tecnologias no Brasil nesse processo de eletrificação?
Sim. No Brasil, o flex fuel, o etanol, é muito importante. Nós temos um centro de desenvolvimento em Araquari para essas tecnologias e a BMW, a nível mundial, está trabalhando em outros tipos de tecnologias.
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Em Araquari, por termos este centro de desenvolvimento, queremos seguir investindo em tecnologias importantes para o mercado brasileiro.
Além do X1, a BMW pensa em montar outro produto no Brasil?
Por ora seguiremos produzindo o X1 e o Série 3. No entanto, trabalhamos muito para isso [montar novos produtos no Brasil].
A fábrica da BMW em Araquari é a única de uma marca premium que, desde que foi inaugurada, vem produzindo de forma constante. Quais são as perspectivas para a unidade?
Nós agora tivemos esse investimento para a produção do X1. Estamos preparando a planta de Araquari para o futuro. Vamos passo a passo. Por enquanto, o X1, e depois vamos planejar novos produtos.
Como está o volume de produção? E as exportações a partir da unidade?
Aproximadamente 10 mil unidades são produzidas ao ano em Araquari, todas voltadas para o mercado local. O mesmo para a nossa fábrica de motocicletas em Manaus.
Em 2021 a BMW anunciou investimento de R$ 500 milhões em Araquari para modernizar a fábrica e produzir novos modelos, como você já mencionou. Esse aporte já foi concluído? Há algum novo plano?
Boa parte deste aporte já foi concluído com o início da produção do X1, mas continua por mais anos. Por ora não há planos para novos investimentos.
Remontando ao seu background de vendas, o quão difícil é trabalhar uma marca premium em países considerados em desenvolvimento?
Esta na verdade é uma grande oportunidade de crescimento. Podemos ter um posicionamento de marca distinto, trabalhar com nossos clientes de forma muito mais próxima e, para mim, isso é muito importante.
Em outros mercados mais desenvolvidos, a meu ver, é um pouco mais desafiador. Agora, para a América Latina é uma oportunidade porque temos no segmento premium essa chance de, como já comentei, de estar perto dos clientes. Também temos possibilidades interessantes no pós-venda, de forma a fazer o nosso business crescer.
A Stellantis e a Toyota, por exemplo, têm dito que carros elétricos não são prioridade. Na Europa vemos que há agora um clamor pelo e-fuel. Crê que o caminho rumo à eletrificação 100% pode, de certa forma, regredir em âmbito global?
Nós da BMW queremos dar ao cliente o poder da escolha. Por isso temos modelos totalmente elétricos, híbridos e, naturalmente, movidos a gasolina. Acho que a eletrificação é muito importante para determinados segmentos, e nós estamos em um segmento premium, que seguirá este caminho. Evidentemente, isso não ocorrerá em um ano ou dois, mas acontecerá. No entanto, nosso cliente não deixará de ter o poder de escolha.
Você comentou que a agenda ESG é muito importante para a BMW. O quão fundamental será a diversidade e toda essa agenda na estratégia da empresa no país para os próximos anos?
No Brasil já temos um comitê de diversidade que trabalha com vendas, serviços financeiros, Araquari e Manaus. E não somente diversidade de gênero, mas que também abarca outros grupos. Estamos muito bem-organizados no país e já caminhamos muito bem com esse tema.
Hoje, só para dar alguns exemplos, temos mulheres em algumas posições de liderança. Estamos invadindo [risos]. Este tópico não é novo. A BMW, como grupo, já nos pediu isso faz algum tempo, para que trabalhemos mais a questão. Não à toa, no Brasil as coisas já estão bem estruturadas e já atuamos em várias frentes de diversidade.
Estudo recente da ONG Conference Board apontou que mulheres são mais eficazes que homens na liderança em todos os níveis de gerenciamento e faixas etárias. Por que você acha que isso ocorre?
Não tive acesso a essa pesquisa. Pessoalmente, não acho que seja um tema de mulher ou homem, mas sim de capacidades e atitudes. Provavelmente, nós mulheres temos que trabalhar muito mais para demonstrar que podemos. Porém, como falei, acho que são determinadas capacidades e atitudes, o desejo de querer fazer bem as coisas – isso sendo homem ou mulher.