Ao apostar só em veículos a combustão, Brasil vai ficar para trás, aponta Volvo Cars

Luis Resende, presidente da empresa para a América Latina, diz que o país deveria investir na produção de baterias e em regulamentação para carros elétricos

Giovanna Riato

Giovanna Riato

Luis Resende, presidente da empresa para a América Latina, diz que o país deveria investir na produção de baterias e em regulamentação para carros elétricos

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A corrida para reduzir a pegada de carbono dos carros conta com diferentes estratégias das empresas, que apostam largamente no etanol e em carros híbridos flex no Brasil. A questão é que, do ponto de vista de regulamentação do país, o caminho deveria der priorizar a eletrificação. Ao menos essa é opinião de Luis Resende, head da Volvo Cars América Latina.


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O executivo lembra que a indústria automotiva vive transformação muito maior do que apenas de motorização. “Estamos falando de momento único de mudança no produto que inclui tecnologia, dirigibilidade, uso, investimento em pesquisa e desenvolvimento”, enumera.

Sobre apostar todas as fichas no carro flex, Resende é categórico:

“Não podemos pensar que uma tecnologia regional [do motor flex] vai se sobressair ao investimento brutal do resto do mundo na eletrificação. No lugar de pensar no nosso mercado de dois milhões de carros, deveríamos focar no mercado global de mais de 70 milhões”, diz.

A postura é bastante distinta da adotada por montadoras de maior volume no Brasil. Volkswagen, Stellantis e Toyota, por exemplo, entendem que veículos híbridos flex é o passo mais certeiro.

Já Resende aponta como estratégia adequada a buscar, por exemplo, por tornar o Brasil um polo de produção de baterias para veículos elétricos. O executivo lembra que a América do Sul concentra grande parte dos elementos químicos necessários ao componente, como o lítio, que tem 70% da reserva global na região. Na visão de Resende, esse seria um caminho promissor para o país acessar o mercado internacional, ampliando exportações.


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“Além disso, temos água em abundância, algo essencial para resfriar as fábricas de baterias. Poderíamos fazer o reuso para esse fim”, lembra. Segundo ele, com a regulamentação adequada, esse é uma oportunidade que pode ganhar ainda mais potencial. Vale lembrar que, BorgWarner e WEG já anunciaram que investirão em linhas nacionais para produzir o componente.

Políticas públicas atrasam eletrificação, aponta Volvo

A Volvo Cars ganhou espaço ao ser a primeira marca a vender no país apenas carros híbridos ou puramente elétricos, em 2021. Agora, o executivo mostra preocupação com alguns movimentos, digamos, pouco amistosos ao crescimento da presença de modelos com a tecnologia nas ruas brasileiras.

Um deles foi a decisão do Inmetro de impor novos critérios para a medição da autonomia de carros elétricos. Este ano, o teste para aferir o quanto um veículo pode rodar com uma carga de bateria ficou mais severo. “Está muito exigente, com uma condição de condução que não corresponde à realidade”, diz Resende.


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Além disso, as montadoras precisarão calcular um “pênalti” de 30% sobre os resultados de autonomia coletados em laboratório. Com isso, o número informado pela fabricante aos consumidores será sempre 30% inferior ao apurado nos testes oficiais. No caso do XC40, por exemplo, o alcance divulgado caiu de 420 km para 231 km.

“No uso urbano temos performance muito superior a essa, com a frenagem regenerativa do carro e o próprio comportamento do condutor”, contesta Resende. Segundo ele, as pessoas acabam por “buscar uma direção mais econômica, já que acompanham tudo no painel digital. É quase uma gameficação que acaba por incentivar essa conduta”. 

Imposto de Importação para carros elétricos

Outra medida que gera preocupação é o debate sobre o aumento do Imposto de Importação para carros elétricos, que estaria em negociação entre governo federal e Anfavea, associação dos fabricantes de veículos. A conversa é que a tributação deveria passar por aumento gradual com o objetivo de fomentar a produção local desses veículos.

Com gama 100% importada, Resende diz que o setor ainda vive o trauma das empresas que nacionalizaram a sua produção na última década, sob incentivo da política automotiva anterior, o Inovar-Auto. O executivo lembra que esses investimentos acabaram por dar baixo retorno com fábricas que montam volume pequeno de carros ou, ainda, que desistiram da produção local, como a Mercedes-Benz Cars.

“O Imposto de Importação para carros elétricos precisa voltar um dia, mas temos de fazer isso de forma escalonada. É uma alíquota que afeta acordos bilaterais e, de certa forma, ao impor 35% de tributação para modelos importados, também limitamos a presença de carros brasileiros em outros mercados”, diz.

A sugestão de Resende é traçar uma visão de longo prazo, como início da retomada do Imposto de Importação daqui a dois anos e chegada à alíquota integral talvez apenas em 2030, quando o mercado de veículos elétricos já estará mais maduro localmente.

“A Volvo é hoje líder em eletrificação no Brasil e estamos falando de uma marca que atende faixa de apenas 2% da população brasileira. Fica claro que o carro elétrico não é uma ameaça à indústria local”, diz, reforçando o risco de que medidas desproporcionais acabem por fechar o mercado brasileiro no momento errado e, no fim das contas, ter o efeito contrário, penalizando as própria fabricantes instaladas localmente.