Acordo Mercosul-União Europeia emperra com reflexos nas exportações de veículos

Visto como oportunidade de novos negócios, acordo vive nova onda de impasses entre os países envolvidos

Bruno de Oliveira

Bruno de Oliveira

Visto como oportunidade de novos negócios, acordo vive nova onda de impasses entre os países envolvidos

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O acordo bilateral entre Mercosul e a União Europeia (UE), que representa para montadoras instaladas na região oportunidades de exportação de veículos e componentes, é assunto que passa por turbulência no campo político.

Afora os entraves locais protagonizados pelos países que formam o bloco sulamericano – Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai -, que atrasam um eventual desfecho com os europeus, agora é o Brasil que se mostra insatisfeito com as novas exigências da UE para que haja, enfim, livre-trânsito de mercadorias entre as regiões.


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“O Brasil não vai aceitar os termos desse acordo. Querem que o Brasil abra as portas para as compras governamentais, e nós não vamos fazer isso. Temos que valorizar a indústria nacional”, disse o presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva, na sexta-feira, 2, durante evento realizado na fabricante de ônibus Eletra, em São Bernardo do Campo (SP).

O acordo é uma das bandeiras defendidas pela Anfavea, a associação que representa as montadoras instaladas no país. Enxergam que, por meio dele, o Brasil conseguiria incorporar volumes importantes às linhas locais de produção, que hoje apresentam quadro de ociosidade por causa da menor demanda proporcionada pelo mercado doméstico de veículos.

O presidente usou o mesmo tom para se referir ao acordo com a UE na última semana, durante evento realizado pela Fiesp em São Paulo (SP), que celebrava o Dia da Indústria.

Exportar, sim, mas é preciso olhar para empresas locais

Lula se mostrou favorável ao comércio entre o Brasil e o exterior, mas ressaltou que o seu governo deverá priorizar no país os negócios envolvendo empresas brasileiras.

“Os chineses são os nossos maiores parceiros comerciais, mas nós [Estado] vamos comprar e fortalecer os produtos feitos por empresas brasileiras”, contou o presidente durante o evento na Eletra.

É bom lembrar que, em 2019, após 20 anos de negociações, Mercosul e União Europeia fizeram um anúncio conjunto sinalizando que haviam fechado o acordo bilateral. No entanto, após este episódio – e passada a pandemia – os europeus fizeram novas exigências para que o acordo seja fechado, sobretudo exigências ambientais.

Brasil ainda exporta imposto

Ainda que no futuro Brasil e demais países do Mercosul acertem suas pendências com a União Europeia, existem outros temas que precisam ser discutidos entre indústria e o governo federal para que o acordo proporcione os resultados esperados.

Um deles seria a competitividade do produto nacional ante o seu equivalente produzidos em outras praças. Para Milad Kalume Neto, consultor da Jato Dynamics, isso se resolveria com outra bandeira do setor automotivo: a reforma tributária.

“A grande questão é o custo do nosso produto. Enquanto não tivermos uma reforma tributária que beneficiará todas as áreas industriais no Brasil, tudo o que fizermos não será competitivo naquele mercado”, explicou o consultor.

“Exportávamos alguns modelos para lá com baixa atratividade em função principalmente dos preços, mas também pelo produto. Prorrogar este acordo é uma forma de proteger a nossa combalida indústria”, completou.

Para Leticia Costa, da Prada Consultoria, o acordo representa mais uma oportunidade de acelerar a eletrificação no país do que, no curto-prazo, proporcionar mais exportações às montadoras instaladas no Brasil.

“Todo mundo pensa no acordo como redução de tarifas, e isso possibilitaria exportação cruzada. Mas quando falamos de indústria automotiva, existem outras legislações que podem impedir as exportações de veículos brasileiros, como aquelas que dizem respeito à proibição dos veículos a combustão. Por isso, os resultados de curto-prazo do acordo são complexos. Por outro lado, o acordo poderia acelerar as políticas de eletrificação no país”, contou.

Carro popular: ainda não foi desta vez

Havia grande expectativa de que fosse anunciado na fábrica da Eletra o programa de incentivos fiscais para veículos que custam até R$ 120 mil, o chamado pacote do carro popular, considerando o prazo estabelecido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na semana passada.

As expectativas, no entanto, se esvaíram com a ausência do ministro na comitiva que esteve presente na fábrica da Eletra. Horas antes, também em São Bernardo do Campo, Haddad integrou o grupo que inaugurou um laboratório na Universidade Federal do ABC (UFABC).


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De qualquer forma, o programa deverá ser apresentado, enfim, na segunda-feira, 5, em Brasília (DF). Wellington Damasceno, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, esteve na sexta-feira com o vice-presidente Geraldo Alckmin, e dele teria ouvido que o programa será apresentado na data.

“O vice-presidente nos informou que a apresentação será na segunda-feira. O Haddad já apresentou ao Lula o texto da regulamentação do programa”, contou o representante dos trabalhadores.