Ivan Witt (esq.), do Grupo Caoa, e Martin Fries, da Volkswagen: gerenciando os gargalos de suprimentos causados pela pandemia
Os desafios enfrentados pelos setores de compras das fabricantes de veículos por conta dos efeitos da pandemia foi o tema do debate que reuniu Ivan Witt, diretor de compras, TI e de Recursos Humanos do Grupo Caoa, e Martin Fries, vice-presidente de compras da Volkswagen do Brasil. Em apresentação no AB Plan 21 Near, evento on-line realizado em 3 de março por Automotive Business, os dois executivos foram unânimes em apontar a importância de seus departamentos de logística para contornar os problemas de falta de matéria-prima e de componentes.
Volkswagen e Caoa ainda não precisaram interromper a produção no País por falta de componentes. Witt afirmou que a maioria de seus fornecedores estão na China e ainda não teve problemas de fornecimento. Já Fries contou que seu departamento vem se desdobrando para evitar parada, que “ainda não aconteceram” mas não estão descartadas se os problemas continuarem a crescer.
“Temos o nosso pessoal de logística em contato direto com os fornecedores e todo dia surgem dois ou três casos que a gente tem de resolver, mas os componentes eletrônicos são os itens mais preocupantes no momento”, contou Ivan Witt. “Temos percebido também que quando fazemos ajustes na produção, algum fornecedor aumenta o o tempo de entrega de determinadas peças – que era de três meses e eles querem passar para seis meses, por exemplo. Isso tem efeitos negativos, como o aumento do custo de inventário; mas a ideia é manter as linhas de produção funcionando”, acrescentou.
Fries, da VW, concordou com Witt e lembrou que, na verdade, esse é um “problema positivo”, já que é causado pelo aumento na produção. “Ainda enfrentamos desafios com materiais como aço, borrachas, plásticos etc., mas estamos superando essas dificuldades, acredito que até abril isso já estará praticamente normalizado”, disse. “Mas o que realmente preocupa são os semicondutores, esse é um problema que vai permanecer até o segundo semestre e, talvez, até o fim do ano”, disse.
O vice-presidente de compras da VW também explicou que a montadora está adotando diversas medidas para driblar os problemas com insumos, mas a principal é a comunicação com a cadeia de fornecedores. “Estamos nos comunicando o tempo todo com eles, para sabermos quais problemas eles têm, como podemos ajudar e o que podemos ajustar em nossas linhas”, disse. “Nós dependemos não só de fornecedores locais, trazemos muitos componentes do exterior, então aumentamos a velocidade com que nos comunicamos, tentamos entender e resolver os problemas e assim vamos nos planejando”, afirmou Fries.
DESAFIOS TAMBÉM PARA QUEM IMPORTA
Além das dificuldades com fornecedores, quem traz componentes do exterior enfrenta problemas adicionais, como o preço do frete, que aumentou bastante, e a disponibilidade dos meios de transporte. “Tivemos um aumento muito expressivo no valor do frete e ainda temos de resolver a falta de contêineres e até de navios. Então, do ponto de vista operacional, enfrentamos uma ‘tempestade perfeita’ que está fazendo com que a gente tire todos os truques da cartola para manter as linhas funcionando”, acrescentou Witt, da Caoa.
A globalização e a utilização de plataformas compartilhadas em diversos mercados, em compensação, contribui para reduzir os problemas, já que montadoras como a Volkswagen podem contar com fornecedores instalados em diversas partes do planeta. Isso evita que a filial brasileira da empresa, por exemplo, tenha de entrar em uma fila de espera por conta de um componente produzido por um fornecedor alemão que decida priorizar o fornecimento para a matriz, em Wolfsburg. “Podemos receber componentes de várias fontes de diversos locais do mundo, essa preocupação não existe”, garantiu Fries.
OS LIMITES DA NACIONALIZAÇÃO
Os problemas com material importado levantaram outra questão: o índice de nacionalização dos veículos produzidos pelas duas empresas. Ivan Witt explicou que atualmente o Grupo Caoa utiliza cerca de 27% de componentes nacionais nos veículos Hyundai montados na fábrica de Anápolis (GO) e de aproximadamente 6,5% nos modelos da Caoa Chery – produzidos também em Goiás e em Jacareí (SP). “Estamos trabalhando ativamente para alcançarmos, com a Caoa Chery, o mesmo índice de nacionalização dos carros da Hyundai, esse é o nosso objetivo”, afirmou Witt.
“Na média, temos uma localização de quase 70% nos produtos VW, mas, na realidade, a nacionalização varia entre 55% e 60%, dependendo do câmbio, pois temos alguns fornecedores que importam várias peças e só montam os componentes aqui. Existe chance de ampliar esse número? Sim, é claro, mas isso é cada vez mais difícil, pois o que falta produzir localmente são itens de alta tecnologia que, infelizmente, não encontramos neste momento na América Latina”, explicou Fries.
“O nosso custo – trabalhista e tributário, entre outros fatores – faz com que seja muito difícil avançar nesse quesito, temos o exemplo da Ford, que simplesmente desistiu de fabricar no Brasil”, recordou Witt. “A gente ainda trabalha seguindo o paradigma de altos volumes, mas os produtos que vendemos hoje não têm mais esses volumes, o mercado está pulverizado e a gente poderia ter uma engenharia um pouco mais adequada à quantidade que vamos produzir, buscando redução de custos”, acrescentou o executivo do Grupo Caoa.
“Cada fabricante projeta seu carro de uma maneira, com ferramentas específicas; para que a gente possa sobreviver montando automóveis no Brasil, talvez a gente tenha de se unir e entender que precisamos reduzir o número de especificações para que os fornecedores aqui sejam viáveis. Caso contrário, é muito difícil aumentar o índice de localização, principalmente em componentes de alta tecnologia”, finalizou Ivan Witt.