Atrasos, perdas de receitas e outros fatores levam empresas a revisarem suas metas, segundo a entidade global
“Montadoras e governos na Europa e nos Estados Unidos estão revisando suas metas relacionadas aos veículos elétricos?”, perguntei para John Bozzella, presidente da Oica, a associação mundial das fabricantes de veículos na quinta-feira, 26. “Sim”, respondeu o executivo.
Bozella confirma o que fatos recentes indicam já há algum tempo. Questões técnicas, financeiras e até políticas se mostram como grandes entraves à viabilidade do automóvel elétrico como algo massivo no mercado global. Pelo menos no tempo em que as montadoras ocidentais imaginavam.
Do ponto de vista financeiro, estas empresas estariam com dificuldades em manter os investimentos necessários para executar suas transições para a eletrificação.
Nos Estados Unidos, por exemplo, General Motors e Ford registraram perdas importantes em suas receitas em função da greve que paralisou parte de suas fábricas naquele país. E perder faturamento é algo grave neste momento em que eletrificação demanda mais recursos como nunca.
Essa incerteza em termos financeiros levou inclusive a Honda a quebrar um acordo que tinha com a GM no desenvolvimento de modelos elétricos de entrada.
A Ford, que também alegou perda de dinheiro com a greve, expôs recentemente que não teria condições de competir com fabricantes chinesas no mercado de elétricos, que conseguiram escala e protagonismo na produção de componentes estratégicos, como as baterias.
PODCAST RADAR:– Por que o custo de produção virou a pedra no sapato das montadoras na era do carro elétrico?
Para tal, seria necessário investir mais na produção local de baterias. E, assim, conseguir baixar os preços dos veículos aos patamares dos praticados atualmente pelas fabricantes chinesas na Europa e nos Estados Unidos.
Ambas as montadoras sediadas nos Estados Unidos estão vendendo menos veículos elétricos fora de seus domínios. O que mostra que, de alguma forma, perderam espaço para outros competidores.
Na China, o maior mercado de veículos elétricos do mundo, as vendas da GM caíram 20% no comparativo 2021-2022. No caso da Ford, a queda foi de 33,5%, segundo dados da consultoria Automobility Ltd.
“O veículo elétrico produzido no ocidente está com preços maiores no mercado global na comparação com outros fabricados na Ásia, e isso é complexo do ponto de vista comercial quando vemos alguns consumidores na Europa e nos Estados Unidos preocupados com inflação e taxa de juros altos”, comentou Bozella.
Questões técnicas também emperram o cronograma das fabricantes ocidentais. A Volkswagen, por exemplo, está em processo de reestruturação da sua subsidiária da área de software veicular, a Cariad, para adequar custos de desenvolvimento. Até 2 mil funcionários da empresa podem ser demitidos e lançamentos de modelos elétricos podem ser postergados.
Oportunidades para o Brasil
Com parte da indústria em busca de alternativas viáveis de descarbonização veicular, o Brasil surge como uma espécie de caso de sucesso com os modelos híbridos. Foi o que disse o presidente da Anfavea, Marcio de Lima Leite, no evento em que a entidade nacional recebeu membros da Oica, em São Paulo (SP).
“Nós estamos colocando regras no cenário mundial nas alternativas de descarbonização. Não somos mais um país que apenas segue uma tendência”, contou Leite. “O elétrico é mais caro hoje. Por isso, o híbrido se mostra como uma alternativa interessante.”